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Depois dos 40, PODTudo!

Atualizado: 10 de set.

Podcast da jornalista Adriana Cunha mostra que mulheres 40+ descobrem que envelhecer também é rir, desejar, reinventar e gozar.


Adriana Cunha. Foto arquivo pessoal.
Adriana Cunha. Foto arquivo pessoal.

Essa entrevista não aconteceu em um dia. Nos encontramos numa tarde e conversamos até de noitinha sobre vida profissional e sonhos, entre uma e outra xícara de chá, café, algumas guloseimas e risadas. Depois, marcamos a entrevista pra valer on-line, na esperança de que o enquadramento da tela do computador nos lembrasse da objetividade jornalística, tão questionada por nós duas.


Adriana Cunha é podcaster, doutora em Estudos de Linguagem pelo Cefet-MG e mestre em Discurso e Representação Social pela Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ). Tem duas décadas em redações, assessorias de imprensa e projetos acadêmicos sobre narrativas de vida. Hoje, ela é também a voz por trás do único podcast da região voltado para mulheres 40+.


O então Pod Tudo já está na quinta temporada, que Adriana elabora meio a estes outros trabalhos. Também ativa em pesquisas relacionadas a narrativas de vida, ela abriu um formulário no Google para perguntar às ouvintes o que elas querem saber sobre sexo e, com isso, fazer uma temporada que responda diretamente às dúvidas delas.



Até sábado, a jornalista ainda recebe os comentários que irão moldar os próximos episódios, pois ela também contou que até o fechamento desta entrevista, já estava com um volume substancial de colaborações.


Contudo, antes de conversar lá, é aqui que Adriana fala sobre o início do projeto, os bastidores do PODtudo, como é fazer um podcast no interior e o que aprendeu ao colocar no ar conversas sobre envelhecimento, luto, libido, relações e tabus.


Foto gerada por IA.
Foto gerada por IA.

Revista Mana: Eu queria que você falasse um pouco do início, da criação do Pod Tudo, por que você criou o podcast?


Adriana Cunha: Antes de criar, eu já era uma ouvinte e eu gostava de podcast. Desde a faculdade, se você for ver... Eu cheguei a ter programa de rádio. Isso lá na década de 1990. A gente fez um programa de rádio jornalismo, aqueles programões mesmo, tipo os da Rádio Novelo. Então, eu sempre gostei de rádio. Quando começou com essa coisa do Spotify e com as possibilidades de você ter uma rádio pessoal, de escutar a música que você quer e também os programas, eu comecei a consumir muito podcast. Também já queria ter um projeto mais autoral. Antes um pouquinho da pandemia, tinha começado uma revista com essa pegada de ser para mulheres. A ideia é que ela fosse também em vídeo, né? Ela ia ser online mas com parte de vídeo. Logo veio a pandemia. Eu tinha montado uma pequena equipe e desandou... Quando eu estava no doutorado em Estudos de Linguagem, eu pensei: "Quem sabe agora eu não posso ter o meu projeto de comunicação?" E o podcast é muito interessante porque eu não preciso de equipe. Por isso que eu gosto do áudio. Acabei até contratando um técnico de som. Mas, às vezes, nem tem edição, quase nunca cortei um áudio.


RV: Tá, mas pode tudo? Qual era o assunto?


Adriana Cunha: Eu já estava muito interessada pelas questões do envelhecimento. Escolhi esse tema, mas fiquei um pouco insegura. Pensei: "Será que é uma boa?" Aí já tinha feito uma entrevista e resolvi jogar. Foi uma surpresa, porque o tema foi muito elogiado.


RV: E quantas temporadas você já fez?


Adriana Cunha: Eu fiz uma edição especial, mas considero ela uma temporada. Então essa agora vai ser a quinta.


RM: Mas não ficou claro para mim: "Pode tudo"? Do que ele é feito? Para que? Para quem?


Adriana Cunha: O meu público é feminino, mulheres 40+. Eu tenho as métricas do Spotify que mostram isso. Tenho também um pequeno percentual de homens e de mulheres 40 menos. Quando pensei no nome, foi tudo muito rápido. Eu não fiquei cozinhando muito. Falei: Pode tudo. Por quê? Porque eu queria um podcast voltado para mulheres 40+, mas onde pode-se falar sobre tudo. Não queria que fosse só sobre envelhecimento. Eu queria trazer pessoas para falar sobre tudo que nos interessa nesse momento da vida.


RM: Você fala de um lugar do "nós", né? E juntou sua rede social com o podcast. Tem esse perfil de ser uma coisa mais individual sem deixar o jornalismo e a jornalista que você é. Mas eu queria que você explicasse essa ligação da sua individualidade neste trabalho.


Adriana Cunha: Eu tinha meu Instagram pessoal, que já usava profissionalmente. Em algum momento comecei a fazer entrevistas lá, só que meu Instagram foi hackeado. Eu já tinha um bom número de seguidores. Tentei recuperar, fiz todos os processos, mas não deu. Inclusive, foi para golpe mesmo. Três ou quatro pessoas caíram. Então decidi começar o Instagram do zero a partir do podcast. Eu também não queria um Instagram showroom, asséptico, só balcão de venda. Então, não vivo em função de algoritmo. Além do podcast eu também ofereço serviços, por exemplo, para profissionais liberais que queiram ter seu podcast. Acabei postando coisas pessoais também. E acho que ali tem jornalismo, principalmente quando estou no meio de uma temporada. Eventualmente escrevo alguma coisa, mas ali está muito menos uma persona jornalística e mais uma podcaster que diz: "Olha, as coisas legais, as pessoas legais com quem estou conversando estão aí". Então, eu meio que vou juntando os assuntos nas diferentes áreas da vida. Poderia até estar exercendo só esse lugar de jornalista, mas estou correndo atrás de outras coisas.


RV: Então não tem objetividade ou você afasta a sua subjetividade para levantar os temas?


Adriana Cunha: Não, não tem. Eu não me afasto. Inclusive isso fazia parte do meu projeto pessoal de, em algum momento, desenvolver um produto que fosse de comunicação. Sabe aquela liberdade que você quer, que você não tem mais um patrão, um dono de jornal ou de TV que vai ficar te dizendo o que você pode ou não pode fazer? Então eu falei: "Cara, eu vou ser eu aqui". Mas eu até que me seguro um pouco.


RV: Eu te falei que você está a um passo de ficar fazendo terapia para o mundo ver, igual a Tati Bernard, não te falei (risos) ? Por isso que eu entrei nessa pergunta. Mas e aí? Como é que é a sua relação com isso? Como é que você modula isso, para não passar esse limite?


Adriana Cunha: Vou te dar o exemplo de uma entrevista. Fiz uma sobre luto e envelhecimento com uma psicóloga muito legal, a Jéssica. Ela trabalhava com familiares de pacientes em tratamento de câncer, terminais. A gente falou sobre o que significa envelhecer para mulher na nossa cultura. E eu até comentei com ela: eu tive uma data, com 45 anos, que comecei a ver sinais de envelhecimento. Não estava lidando bem. Pensei: "Não tá na hora de voltar para terapia?". Achei que estava perdendo meu poder de sedução, de mulher. Pensei: "Agora eu tô para escanteio". E depois falei: "Não, que pensamento errado, vamos para terapia". Eu queria ter me vulnerabilizado mais com ela, mas não fiz. Porque eu não faço o podcast para mim, sabe? Se não, eu ia ficar falando de mim o tempo inteiro. Tomo muito cuidado para não cortar a pessoa com quem converso. Quero aprender com ela, e imagino que quem esteja ouvindo também. O limite é esse: minha vida não é tão interessante. Uso meu background às vezes só para fazer perguntas melhores, antecipando o que o ouvinte gostaria de saber.


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RM: Então você tem um ouvinte imaginário?


Adriana Cunha: Sim, sim. É essa mulher 40+, até 50+. Quando vou fazer minha pauta, penso nela. Outra coisa: como jornalistas, a gente tem uma pauta, mas não fica presa. Às vezes o entrevistado traz uma questão e você muda o rumo.


RM: E qual foi o feedback que te deu a certeza de continuar? Aquilo que te inspira?


Adriana Cunha: Teve vários. Vou citar dois. Uma moça que conheço pouco, um dia, no aniversário do marido de uma amiga, veio me cumprimentar sorrindo e falou: "Eu escuto todos os episódios do PODTudo". Ela disse que odiava exercício físico, nunca tinha se preocupado com isso. Depois de ouvir a primeira temporada, especialmente a entrevista com a doutora Mônica, ela marcou um médico para fazer check-up e começou atividades físicas. Ela falou: "Quero envelhecer bem". Eu fiquei super feliz, porque pensei: "Porra, é isso!". Não é fácil: você não tem salário, estou trabalhando sem salário. Mas eu gosto tanto que continuo mesmo assim. Teve também a Zezé Cassiano, que eu entrevistei. Depois ela disse: "Nossa, quanto retorno eu recebi da minha entrevista!". Esse é um bom medidor de que pessoas estão ouvindo mesmo. E acho que também dei sorte: veio junto com o movimento de falar sobre menopausa, envelhecimento feminino... Muitas mulheres famosas começaram a falar disso.



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RM: Quinta temporada já, né? Em quantos anos?


Adriana Cunha: Três anos. É bem intenso. Ano passado eu estava num ritmo muito grande. Esse ano foi mais difícil, porque comecei a trabalhar em Nazareno, ia todo dia para lá. Depois saí em abril e o Felit já estava pegando fogo. Então ficou difícil.


Adriana também é secretária da Associação Palavra Bem Dita, proponente do Festival de Literatura de São João del Rei, Felit, em que atua como curadora, faz a assessoria de imprensa e a parte de cerimonial.


Eu não tenho equipe, Dani. Toda temporada é um trabalho grande: elencar quem quero conversar, ir atrás das pessoas, depender das agendas. Por isso começo a gravar antes. Tenho também uma estratégia: em cada temporada gosto de ter uma pessoa de mais projeção. Isso ajuda a engajar, dá um peso. Por exemplo, quando as pessoas escutam a entrevista com a Marta Medeiros, pensam: "Ó, que legal, não é brincadeira".


RM: E para a próxima temporada, você já tem um nome de projeção que pode adiantar para o público da Mana?


Adriana Cunha: Pois é. Essa temporada foi totalmente fora da minha caixa. Eu gosto disso: não tenho compromisso de formato. Chamei a psicóloga Luma Morais, que é muito foda. Conheci quando ela ainda estava na faculdade e pensei: "Nossa, essa menina, o que será dela quando tiver 40 anos? Porque com 18 já está assim!". Aí aconteceu uma coisa: a professora Patrícia Matos, da UFSJ, viu o vídeo com a Luma e me mandou um áudio: "Acabei de entregar um artigo, se você quiser colaboração…". Eu falei: "Putz, Patrícia!". Convidei-a para fechar a temporada. Ela tem pesquisa, artigos maravilhosos... Ela tem muita projeção!


RM: E me fala um pouquinho também sobre fazer um podcast no interior. Porque você falou que foi numa festa de aniversário e encontrou uma ouvinte. Como você imagina que esse fator, da gente estar tão próximo, sem essa coisa da celebridade, influencia no seu fazer diário?


Adriana Cunha: Primeiro, a gente sabe que temos aqui no entorno — São João, Tiradentes, Resende Costa e por aí vai — uma rede enorme. E nem conhecemos todo mundo. Eu tenho essa pretensão, Dani: eu gostaria de ser o maior podcast das Vertentes!


RM: Tem outros podcasts aqui na região? Você já fez esse levantamento?


Adriana Cunha: Tem, já vi, mas não tem nenhum igual ao meu. No interior, a primeira coisa é essa: tem tanta gente foda. Tipo eu, tipo você. Tem gente muito legal e fazendo coisas importantes. Olha o trabalho da Zezé Cassiano, por exemplo. Ninguém falava de envelhecimento quando ela trouxe para a universidade o projeto “Universidade para a Terceira Idade”, lá nos anos 1990. Naquela época, ninguém estava preocupado com velho. A ideia era: "Ah, já vai morrer mesmo". E não é assim. Zezé já estava lá, estudando o tema, muito antes dessa transição de olhar para o envelhecer. Então, o que me move também é apresentar essas pessoas. Mostrar o que fulano está fazendo, o trabalho de ciclano. Isso para mim é muito legal, porque acho que a comunidade ainda está em bolhas.


RM: Mas e o desafio de expandir além dos limites destas Vertentes?


Adriana Cunha: Pois é, esse é o ponto. Não adianta eu querer sair dos muros de São João del-Rei sem pensar: será que já cheguei em Matosinhos? Na Colônia do Marçal? A cidade tem 90 mil habitantes, e eu atingi só um recorte. Ainda que fale para mulheres 40+, estou falando para mulheres escolarizadas, com bom nível de recursos. Só que existem muitas formas de envelhecer. Não é a mesma coisa para uma mulher negra, trabalhadora, que foi babá a vida inteira e até hoje não se aposentou. Então, penso muito nesse desafio: como alcançar um público mais diverso.


RM: E falando de diversidade de temas, vamos falar de sexo? Vai rolar na nova temporada não é?


Adriana Cunha: Vai, claro. E a gente sabe que ainda existem muitos tabus. A libido é impactada pela menopausa, e como lidar com isso? Teve uma ouvinte que falou: "Quero um relacionamento, mas não sinto falta de sexo". E aí? Está tudo bem para ela. Mas e o companheiro? Ele também teria que ser assexuado? São discussões importantes. É bom ter psicólogas para diferenciar sexualidade de sexo. Quero falar abertamente. Talvez quem tem “estômago delicado” não queira ouvir sobre sexo anal, mas é um tema que pediram. E eu não fujo.


RM: Mas vai ficar um episódio inteiro, 50 minutos, só sobre sexo anal, por exemplo? Serão episódios temáticos?


Adriana Cunha: Não necessariamente. Meus episódios variam entre 30 minutos e 1 hora. Depende da conversa. O tempo é o tempo do assunto. Mas sexo anal dá muitas camadas. A Luma, por exemplo, falou: "A mulher sempre fala a partir do desejo do homem". E eu disse: "Luma, vou ser honesta: tenho 52 anos e só ouvi uma mulher me falar que adora dar o cu. A maioria diz: 'Tá, dou de vez em quando, não me incomoda tanto'". Então, quero trazer isso. E também porque sei que tenho homens ouvindo...


RM: E eles dão retorno?


Adriana Cunha: Sim. No caso dos episódios sobre envelhecimento, recebi muito retorno masculino. Foram os que mais geraram comentários de homens, porque também os afeta, ainda que de forma diferente. E eles dão até sugestões. Às vezes falam: "Faz um episódio sobre isso".


RM: E tem muita pergunta da comunidade LGBTQIAPN+?


Adriana Cunha: Até o momento não.


RM: Essas sugestões surgiram nesse questionário que você abriu no google forms?


Adriana Cunha: Já tinha feito votação antes. Coloquei alguns temas: sexualidade, escrita feminina, amor e afeto. Sexualidade ganhou, escrita feminina ficou em segundo. Nesse último formulário, apareceram umas 18 perguntas. Muitos sobre dependência emocional e relacionamentos com pessoas narcisistas. Também surgiram duas questões sobre não monogamia. Aliás, uma delas veio com erro conceitual. E eu achei ótimo, porque pensei em começar o episódio com áudios de mulheres 60+ contando como chamavam "abrir a relação" antigamente. Mostrar essa evolução. Também apareceram relatos sobre parcerias de longa data: brinquedos sexuais, reconstrução de afinidades, ou quando o sexo acaba sem que isso termine o relacionamento. Questões importantes, especialmente na terceira idade.


RM: Porque sexualidade é mais amplo, né?


Adriana Cunha: Exato. Não é só homem com pênis, mulher com vagina e orgasmo. Sexualidade vai muito além.


Vamos escutar!


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